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Perspectivas

Deter as demissões em massa na fábrica de Warren Truck da Stellantis!

Publicado originalmente em 14 de agosto de 2024

O anúncio de 2.450 demissões na fábrica de Warren Truck da Stellantis, em Michigan (EUA), marca uma nova fase na guerra global contra os empregos. Os trabalhadores do setor automotivo devem travar uma luta aberta para parar os cortes com ações coordenadas, independentes da burocracia sindical, unindo os trabalhadores dos EUA e do mundo. Não se deve perder tempo até 8 de outubro, quando os cortes estão programados para entrar em vigor.

Trabalhadores da Stellantis na fábrica de Warren Truck na troca de turnos

Os cortes, equivalentes a dois terços da força de trabalho da fábrica, ameaçam o fechamento de uma importante fábrica no centro do setor automotivo dos EUA. A medida também terá um grande efeito dominó, provocando demissões em toda a cadeia de fornecedores de peças.

Sem dúvida, os trabalhadores da Warren Truck estão sendo perseguidos por sua militância. A fábrica possui muitos trabalhadores suplementares, em sua maioria jovens, que estão lutando para sobreviver, bem como trabalhadores vindos de outras fábricas já duramente atingidas por demissões. Na eleição de 2022 para presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Automotiva (UAW), o operário socialista Will Lehman obteve 8,4% dos votos na fábrica, e muitos trabalhadores têm participado de comitês de base para se oporem às traições da administração e do sindicato.

A fábrica também foi a primeira nos EUA a integrar uma greve global selvagem no início de 2020 para forçar o setor a parar a produção durante a primeira onda da pandemia da COVID-19, uma iniciativa dos trabalhadores que salvou inúmeras vidas.

O ataque à Warren Truck faz parte de uma carnificina global no setor automotivo. Desde o início deste ano, mais de 8.000 trabalhadores das “Três Grandes” dos EUA [Ford, GM e Stellantis] perderam seus empregos. A Stellantis cortou milhares de funcionários da Fiat na Itália, a Volkswagen está cortando empregos em toda a Europa e a General Motors anunciou grandes cortes em suas operações na China.

O presidente do UAW, Shawn Fain, mal escondendo sua indiferença, teria dito recentemente aos trabalhadores da fábrica da Mack, em Detroit, que o setor automotivo simplesmente “tem seus altos e baixos”. De fato, o UAW ajudou a cortar centenas de milhares de empregos nos últimos 50 anos.

Isso agora atingiu um novo estágio, no qual as montadoras estão usando veículos elétricos e automação para eliminar seções inteiras da força de trabalho. Como disse o CEO da Stellantis, Carlos Tavares, “a corrida dos veículos elétricos se tornou uma corrida de redução de custos”.

Isso faz parte de um ataque global a empregos em todos os setores, inclusive entre entregadores, trabalhadores de tecnologia, atores e trabalhadores do setor de entretenimento, entre outros. A Paramount anunciou que está fechando seus estúdios de TV homônimos e demitindo 15% de sua força de trabalho. O objetivo é quebrar a oposição da classe trabalhadora, expressa na crescente pressão por ações de greve.

A classe capitalista quer impor os custos da crescente crise global aos trabalhadores. O aumento do desemprego, combinado com um custo de vida persistentemente alto, contribuiu para um declínio nas vendas de veículos novos, que dificilmente eram acessíveis inicialmente. Enquanto isso, os lucros corporativos dos EUA no último trimestre de 2023 foram superiores a US$ 2,8 trilhões, o maior da história. Embora os mercados de ações também permaneçam em níveis históricos, a crescente volatilidade e o perigo de uma nova desaceleração só aumentaram a necessidade de as empresas cortarem custos.

Há também a necessidade de liberar recursos para a guerra. Os cortes de empregos foram anunciados enquanto a Ucrânia lançava uma grande ofensiva contra a Rússia usando veículos blindados americanos e alemães, e os EUA, apoiando seu intermediário israelense, preparavam-se para uma guerra regional no Oriente Médio contra o Irã. Os trilhões despejados em gastos militares devem ser extraídos, no final, de uma maior exploração da classe trabalhadora.

Como a Rede de Comitês de Base de Trabalhadores da Indústria Automotiva declarou recentemente:

A Warren Truck é agora um campo de batalha crítico na guerra global contra o emprego. Os trabalhadores da indústria automotiva devem fazer disso o início de uma ampla contraofensiva, contrapondo o direito dos trabalhadores ao emprego e a um padrão de vida decente ao chamado “direito” da administração ao lucro.

Essa campanha deve ser internacional, enfatizou a declaração. Na era da produção globalizada, “não existe mais uma montadora ‘americana’... Nossos verdadeiros aliados não são os empresários americanos ‘leais’, mas os trabalhadores da indústria automotiva de todos os países”. Durante décadas, as montadoras colocaram os trabalhadores de cada país uns contra os outros, mas isso só foi possível porque os trabalhadores do setor automotivo permaneceram divididos entre as fronteiras nacionais. Unida globalmente, a classe trabalhadora é muito mais poderosa do que os patrões.

Isso exige uma luta contra a burocracia sindical. As montadoras estão confiando totalmente nos burocratas do UAW e dos sindicatos de outros países para estrangular a oposição às demissões.

A gestão Fain no UAW foi eleita com a participação de apenas 9% dos eleitores, em meio à supressão maciça de votos, como parte de uma operação que envolveu a Casa Branca para elevar um burocrata experiente como o chamado “reformador”, para ajudar a aprovar os cortes que estão em andamento. Isso significa que os trabalhadores que lutam para defender seus empregos devem exigir uma nova eleição sindical, supervisionada pelas bases.

Todos os cortes mais recentes ocorreram desde a impotente “standup strike” [uma greve que paralisou apenas um punhado de fábricas da Ford, GM e Stellantis nos EUA] no ano passado, que foi seguida por um contrato que os burocratas do UAW – bem como o presidente Joe Biden – apresentaram falsamente como uma vitória.

O vice-presidente do UAW-Stellantis, Rich Boyer, admitiu que os dirigentes sindicais sabiam que as demissões estavam previstas, mas não disseram nada aos trabalhadores. O presidente local da Warren Truck também admitiu à imprensa que as dirigentes sindicais na fábrica sabiam que essas demissões estavam planejadas. O UAW se recusou até mesmo a informar os trabalhadores, muito menos a organizar uma campanha contra as demissões.

Os burocratas sindicais têm sido parceiros ativos nos cortes de empregos há décadas. Um ponto de inflexão importante ocorreu no final da década de 1970, quando o presidente do UAW, Doug Fraser, entrou para o Conselho de Administração da Chrysler e ajudou a fechar dezenas de fábricas.

Eles ajudaram a reduzir as condições de trabalho nas fábricas para um nível anterior à fundação do UAW, durante as greves dos anos 1930. Enquanto isso, os ativos do sindicato aumentaram para mais de um bilhão de dólares, e centenas de dirigentes “recebem” salários de seis dígitos, complementados por subornos e corrupção.

A burocracia depende de seus laços com a política capitalista, especialmente por meio do Partido Democrata. Biden vê os burocratas sindicais como parceiros de guerra, o que foi resumido em sua declaração no mês passado de que a AFL-CIO é sua “OTAN doméstica”. Mas esse é um conflito único com frentes não apenas no exterior, na Ucrânia e em Gaza, mas em casa, contra a classe trabalhadora americana.

Para preparar a opinião pública e desviar a atenção da responsabilidade do capitalismo americano pelos cortes de empregos nos Estados Unidos, a burocracia está promovendo o nacionalismo “America First” [“EUA em Primeiro Lugar”] e fazendo dos estrangeiros bodes expiatórios. Em uma das poucas declarações sobre os cortes na Warren Truck, Fain denunciou o CEO português da Stellantis, Carlos Tavares, por destruir uma “outrora grande empresa americana [ênfase adicionada]” e condenou as mudanças de produção para o México em uma tentativa de colocar os trabalhadores americanos contra seus companheiros mexicanos.

O UAW também está reunindo milhões de dólares para apoiar a campanha de Kamala Harris. Centenas de milhares de trabalhadores da indústria automotiva, muitos dos quais nunca receberam cédulas para a eleição do UAW, serão inundados com correspondências do UAW para apoiar a candidata preferida da burocracia. A conta do UAW no X/Twitter não informou sobre as demissões na Warren Truck, mas está anunciando uma “convocação nacional de filiados” para a “campanha do sindicato para derrotar Trump e eleger Kamala Harris”.

O UAW também entrou na justiça com um processo cínico contra os fascistas Elon Musk e Donald Trump por causa de sua recente entrevista no X/Twitter, em que os dois bilionários se gabaram de ameaçar os empregos dos trabalhadores. Essa é uma manobra criada para desviar a atenção dos cortes na Warren Truck e promover Harris como defensora dos trabalhadores.

Na verdade, as demissões foram anunciadas logo depois que Fain se encontrou com Harris em um comício em Detroit, onde ela denunciou manifestantes que criticavam o papel do governo Biden no genocídio em Gaza. Esse é apenas o mais recente de vários eventos em que os burocratas do UAW se alinharam com Harris/Biden contra manifestantes antiguerra, expondo sua resolução de “cessar-fogo” como sendo conversa fiada.

“A questão estratégica central que os trabalhadores enfrentam é se livrar do peso morto da burocracia sindical”, concluiu a declaração da Rede de Comitês de Base de Trabalhadores da Indústria Automotiva. “Ela não tem direito legítimo de liderança”. Isso certamente é verdade.

A luta pelo controle dos trabalhadores de base também está ligada à luta pela independência política da classe trabalhadora. A luta por empregos é, no fundo, uma luta contra o sistema capitalista, que subordina a vida de bilhões de pessoas à motivação egoísta do lucro.

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