O ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro foi preso na manhã do sábado, 22 de novembro, e conduzido à sede da Polícia Federal em Brasília. Sua prisão preventiva foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) após o ex-presidente, que já cumpria uma ordem de prisão domiciliar, violar sua tornozeleira eletrônica.
Em um vídeo anexado ao processo que levou ao decreto de prisão, uma agente federal questiona o ex-presidente sobre as marcas de queimadura ao redor do aparelho de monitoramento. “Eu meti o ferro quente aí. Curiosidade”, Bolsonaro responde.
Em audiência de custódia subsequente, o ex-presidente confessou o ato e o atribuiu a “certa paranoia” e “alucinação” provocada por seus medicamentos psiquiátricos. Ele afirmou ter acreditado que havia uma “escuta” instalada na tornozeleira.
A ação foi interpretada como uma tentativa de fuga de Bolsonaro às vésperas da execução da sua pena de 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado.
Em 11 de setembro, a Primeira Turma do STF condenou Bolsonaro e os integrantes do “núcleo crucial” da conspiração fascista que culminou no ataque de 8 de janeiro de 2023 em Brasília. Os primeiros recursos da defesa de Bolsonaro foram rejeitados unanimemente pelo Supremo e, na segunda-feira, se esgotou o prazo para a apresentação de novos recursos.
Na terça-feira, três membros do “núcleo crucial” foram presos para cumprir suas penas por tentativa de golpe: o general Augusto Heleno Ribeiro, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa; e o almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha.
Além da violação da tornozeleira eletrônica, a prisão preventiva do ex-presidente foi motivada pela convocação de uma mobilização no entorno da sua residência para a noite de sábado. O ato foi convocado pelo senador Flávio Bolsonaro como uma “vigília religiosa” pela “saúde” de seu pai e “pela liberdade no Brasil”.
Moraes argumentou em sua decisão que, “considerando as técnicas empregadas por integrantes da organização criminosa [que orquestrou a tentativa de golpe de 2022-23], o tumulto nos arredores da residência do condenado, poderá criar um ambiente propício para sua fuga”.
A decisão destacou que a residência de Bolsonaro está localizada a cerca de 13 km do Setor de Embaixadas Sul de Brasília, onde fica a embaixada dos Estados Unidos. O risco de fuga para alguma embaixada foi sustentado com base nas evidências de que o ex-presidente “planejou, durante a investigação que posteriormente resultou na sua condenação, a fuga para a embaixada da Argentina, por meio de solicitação de asilo político àquele país”.
O caso de Alexandre Ramagem, deputado do Partido Liberal (PL) e um integrantes do “núcleo crucial” da tentativa de golpe, também foi destacado. Condenado a 16 anos de prisão no mesmo processo que o ex-presidente, Ramagem fugiu do Brasil em setembro, estando atualmente na cidade de Miami, nos Estados Unidos.
A indicação da embaixada dos EUA como potencial abrigo político a Bolsonaro está obviamente associada à intervenção agressiva do governo Donald Trump em defesa do seu aliado político fascista brasileiro.
Em agosto, Trump implementou suas tarifas contra o Brasil com base na alegação de que o julgamento de Bolsonaro era uma “caça às bruxas” que deveria “parar imediatamente”. Moraes, o relator do caso, foi diretamente atacado pelo governo dos EUA, acusado de “juiz ditador” e pesadamente sancionado sob a Lei Magnitsky.
A intervenção imperialista dos EUA na política brasileira não teve sua continuidade abalada pelas recentes negociações de Trump com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores – PT) e a subsequente redução das tarifas. Esse fato foi mais uma vez demonstrado pela reação oficial do governo americano à prisão preventiva de Bolsonaro.
Na noite de sábado, Christopher Landau, vice-secretário de Estado dos Estados Unidos, fez uma postagem no X condenado a prisão de Bolsonaro como “provocativa e desnecessária”. Atacando Moraes e o poder judiciário brasileiro, Landau anunciou ameaçadoramente: “Os Estados Unidos estão profundamente preocupados diante de seu mais recente ataque ao Estado de Direito e à estabilidade política no Brasil”.
A Embaixada dos Estados Unidos no Brasil republicou a manifestação de Landau traduzida para o português.
Como o World Socialist Web Site (WSWS) alertou, o julgamento de Bolsonaro e os militares golpistas não representou o ponto final da ameaça ditatorial no Brasil.
Após o julgamento do “núcleo crucial” em 11 de setembro, o STF julgou outros dois núcleos do caso do golpe de Estado. Entre 17 e 18 de novembro, foi julgado o “núcleo 3”, que envolve militares das forças especiais do Exército, apelidados de “kids pretos”. Eles foram apontados como o braço operacional da conspiração golpista, encarregado de ações violentas como os planos para assassinar Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin e Moraes.
Enquanto oito militares das forças especiais foram unanimemente condenados pelo STF, com penas que chegam a 24 anos de prisão, o mesmo julgamento absolveu o general Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira de todos os crimes. Theóphilo comandou as Forças Terrestres do Exército até 2023 e foi acusado de ter oferecido suas tropas para executar o golpe de Estado.
Expondo a podridão de todo o sistema burguês brasileiro, foi reportado que a decisão do STF foi tomada após um encontro reservado entre Moraes e o comandante do Exército, general Tomás Paiva, em 17 de novembro.
As ações tomadas por Bolsonaro e seus aliados neste sábado, independentemente de quais tenham sido seus cálculos específicos e o grau de sucesso obtido, obedecem à lógica de uma nova ofensiva fascista em andamento.
O vídeo de Flávio Bolsonaro anunciando a “vigília religiosa” pelo ex-presidente deixa isso explícito. Utilizando metáforas extraídas do fundamentalismo religioso evangélico, ele fez uma convocação fascista à ação:
Você vai lutar pelo seu país ou assistir tudo do celular, aí no sofá da sua casa? Eu te convido para lutar com a gente. Nesse primeiro momento, a gente vai buscar o Senhor dos Exércitos. Eu te convido para uma vigília... na altura do condomínio do meu pai... para orarmos pela saúde dele e pela volta da democracia no nosso país.
Flávio respondeu à ordem de prisão contra seu pai com acusações fraudulentas de perseguição ao “cristianismo” e criminalização do “direito sagrado constitucional de reunião, do livre exercício da crença”.
Seu irmão, o deputado Eduardo Bolsonaro, declarou no X que a prisão do ex-presidente tem o objetivo de “assassiná-lo, é um plano de tortura”.
A publicação prossegue:
O nosso adversário quer que estejamos desesperados. Ele intencionalmente espera que a reação a isso tudo seja um desânimo e aquele sentimento de “já acabou”. Não acabou.
Nós somos corajosos. Então a gente vai continuar, agora sim, mais do que nunca, trabalhando para se fazer justiça no Brasil, que começa, vocês sabem, com a pauta da anistia. (...) É chegado o momento de colocar energia máxima e não permitir mais que o Brasil seja o quintal de ditadores.
O clamor de Eduardo por não deixar que o Brasil “seja quintal de ditadores” é uma inversão cínica dos fatos. Foi o imperialismo americano que historicamente apresentou a América Latina como sendo o seu “quintal” e, sob essa doutrina, promoveu golpes e ditaduras militares assassinas na região.
Anunciando a guinada militar e política de Washington contra a América Latina e seu objetivo de confrontar a influência chinesa na região, o secretário da Guerra, Pete Hegseth, declarou em abril: “vamos recuperar nosso quintal”.
Eduardo Bolsonaro, que se mudou aos Estados Unidos para coordenar a atuação dos fascistas brasileiros com o governo Trump, está diretamente envolvido com esses planos imperialistas.
Em sua postagem, ele afirma que a “pauta da anistia” é apenas o começo da reação política sendo planejada. Seu desenvolvimento – como declarou após a condenação de seu pai, em setembro – passa pela intervenção crescente política e mesmo militar de Washington. Eduardo citou especificamente a intervenção na Venezuela, contra a qual Trump prepara abertamente uma guerra por mudança de regime, como paradigma para o futuro político do Brasil.
