Publicado originalmente em 8 de fevereiro de 2023
Um dia após um devastador terremoto de magnitude 7,8 e seus tremores secundários atingirem a região fronteiriça entre a Turquia e a Síria, o número de mortos ultrapassou 7.700. Enquanto os esforços de resgate e recuperação continuam, espera-se que esse número continue aumentando. O terremoto é um dos mais fortes já registrados na região e o mais mortífero em quase 25 anos.
Mais de 11 mil edifícios foram destruídos pelo terremoto em dez províncias da Turquia, incluindo arranha-céus e hospitais. Vídeos postados nas redes sociais mostram blocos de apartamentos inteiros desmoronando repentinamente. No noroeste da Síria, famílias inteiras ficaram presas sob os escombros de suas casas desmoronadas. Dezenas de milhares em ambos os países ficaram feridos e centenas de milhares estão hoje desabrigados, lutando para sobreviver em meio às baixas temperaturas do inverno.
Ao todo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que até 23 milhões de pessoas foram diretamente afetadas pelo terremoto, incluindo 1,4 milhão de crianças. Em uma declaração, o diretor geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus disse: “É agora uma corrida contra o tempo”. “A cada minuto, a cada hora que passa, as chances de encontrar sobreviventes diminuem”. Segundo uma estimativa da OMS, o número de mortos pode chegar a 30 mil.
Apesar dessa catástrofe, a administração Biden se recusa a retirar as sanções impostas pelos EUA contra a Síria, que impedem drasticamente a entrada de ajuda humanitária. Isso significa que muitos outros sírios irão morrer devido ao desastre. Washington também não pretende fornecer qualquer ajuda humanitária ao governo Assad em seus esforços de recuperação. Em vez disso, o porta-voz do departamento de Estado, Ned Price, deixou claro que a administração Biden via o desastre como uma oportunidade para re-acelerar a sua operação de mudança de regime e direcionar mais dinheiro e apoio para suas forças de procuração.
Price disse aos repórteres na segunda-feira: “Seria bastante irônico – ou até mesmo contraproducente – nos solidarizarmos com um governo que brutalizou seu povo ao longo de 12 anos”. “Em vez disso, temos parceiros humanitários no território que podem fornecer o tipo de assistência após esses terremotos trágicos”.
A recusa implacável da administração Biden em fornecer ajuda ao governo sírio, quando sabe que suas ações irão resultar em mais sofrimento e mortes, lembra a afirmação da secretária de Estado Madeleine Albright em 1996 de que a morte de 500 mil crianças iraquianas causada pelas sanções econômicas dos EUA contra Bagdá “valeu a pena” para promover a mudança de regime.
Enquanto isso, o Presidente Joe Biden prometeu “toda e qualquer assistência necessária” à Turquia em comentários na segunda-feira. Entretanto, é certo que a administração Biden irá procurar explorar o desastre para pressionar seus interesses geopolíticos contra Ancara, em particular, entorno da guerra contra a Rússia.
O governo do presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan, impediu a rápida adesão da Finlândia e da Suécia à aliança militar da OTAN, da qual a Turquia é membro desde 1952. A Turquia mantém fortes ligações econômicas e militares com a Rússia, e Erdoğan tem procurado mediar o conflito na Ucrânia, mesmo enquanto os EUA e as potências imperialistas na Europa pressionam uma escalada que ameaça levar a uma guerra nuclear catastrófica. Erdoğan sobreviveu a uma tentativa de golpe militar em 2016, que teve as marcas de uma conspiração nascida em Washington, e os EUA mantêm uma aliança militar com as forças nacionalistas curdas na Síria e no Iraque, consideradas organizações terroristas pela Turquia.
Apesar dessas discordâncias, Erdoğan e seus antecessores desempenharam um papel fundamental nas intervenções imperialistas no Oriente Médio, inclusive na Síria, onde também apoiaram grupos islâmicos contrários a Assad na guerra civil e empregaram tropas contra as forças curdas sob o pretexto de travar uma “guerra ao terror”.
Em última instância, o desastre do terremoto expõe a hipocrisia do imperialismo americano e explode a narrativa de que os EUA faz intervenções no mundo inteiro para defender os “direitos humanos”. O imperialismo americano é hoje o maior assassino em massa no mundo, utilizando seu poderio militar para pisar nos direitos humanos e na vida humana onde quer que ele atravessa.
As guerras que os EUA travaram desde os anos 1990, do Iraque e dos Bálcãs ao Afeganistão, Líbia, Iêmen, Síria e Somália, mataram milhões, deslocaram dezenas de milhões e deixaram sociedades inteiras indefesas contra as privações dos desastres naturais. Essas guerras se transformaram em uma guerra aberta contra a Rússia, mesmo enquanto o imperialismo americano prepara uma nova escalada de suas intervenções assassinas no Oriente Médio, com preparativos para a guerra contra o Irã e em toda a região.
Desde 2011, começando na administração Obama, os EUA alimentaram uma guerra civil na Síria com o objetivo de derrubar o regime do presidente Bashar al-Assad. Através do armamento e financiamento de milícias islâmicas e de sanções econômicas punitivas, Washington deixou a sociedade síria destruída e cidades inteiras devastadas. A guerra deslocou 13 milhões de sírios, incluindo 6,7 milhões de refugiados, muitos dos quais residem em campos rudimentares e moradias inadequadas em ambos os lados da fronteira na região atingida pelo terremoto. Mais de meio milhão de sírios foram mortos na guerra, que dura mais de uma década.
Sob a cobertura do quase completo apagão da mídia, os Estados Unidos mantêm uma força de ocupação de aproximadamente 900 tropas divididas entre a base militar de Al Tanf, no sul da Síria, e os campos de petróleo no leste do país, onde estão instalados desde 2014, negando ao país o acesso aos críticos recursos necessários para a reconstrução da infraestrutura destruída na guerra e após o terremoto.
As sanções dos EUA contra a Síria devem ser retiradas imediatamente, e suas operações de ocupação e mudança de regime devem terminar. Isso deve ser combinado com a mobilização de recursos sociais para fornecer ajuda de emergência e reconstruir a infraestrutura sobre uma base científica para proteger a população contra terremotos. Esses esforços devem ser financiados com as enormes quantias que são gastas na guerra e direcionadas para as contas bancárias dos ricos. Tal programa progressivo exige a construção de um movimento da classe trabalhadora contra a guerra e contra o sistema capitalista.